São 8 da manhã de um dia qualquer do final do Verão. Aguardo no Campo das Cebolas por um autocarro...
O trânsito que se faz sentir às 9 da manhã é intenso, enche a Rua da Alfândega até às costuras, e assim será até à 24 de Julho. O meu autocarro vem, mas não me apetece ir neste, demasiado cheio e sem interesse para eu fotografar... Espanto-me quando vejo aproximar o tão desejado "alvo", aguardo mais um pouco e entro nele.
Trata-se da carreira 706, ou 6 para quem ainda não está habituado a comercialismos e marketings sem nexo. A 706 é uma boa carreira para quem gosta de conhecer o "coração" da cidade, dá-nos um pouco de tudo, parte de oriente no Campo das Cebolas em direcção a ocidente , voltando depois a oriente. O sol aquece bem junto ao Tejo, talvez mais um dia de calor. Identifico-me com algo que está a passar na rádio, música para os meus ouvidos, mas mesmo assim é muito difícil perceber um som que não sai "limpo" por entre o roncar clássico de um B10R e o trânsito que engole o Largo do Cais do Sodré. Só agora é que entram algumas pessoas, principalmente estudantes que se dirigem mais adiante no percurso. O autocarro segue, cruza Santos sobe a São Bento e a seguir ao Rato. Deixamos há muito o Tejo para trás, somos engulidos novamente pelas casas e ruas estreitas, o trânsito e novamente os largos. Observo a ainda grande quantidade de gente que se encontra à espera dos transportes para mais um dia de tortura de 8h de trabalho, mais para uns do que para outros...
Neste momento o autocarro desce a Alexandre Herculano, estando prestes a atravessar a Av. da Liberdade.
Gosto particularmente da cidade de manhã, atravessá-la, mesmo que o 706 passe por zonas que de dia cobrem-se com mil caras mas de noite são o pólo da exploração feminina e talvez do flagelo da droga pesada. Muitas fazem-no por prazer, outras por sustento que tortura.
Estou a pouca distância da Praça do Chile, o autocarro vem com pouca gente, apenas uma realidade que será corrompida na próxima paragem com pessoas de idade que vão aqui ou ali, ou então vão deambular de carreira em carreira, de sítio em sítio até que a manhã ou o dia acabem.
O autocarro sobe até à Praça Paiva Couceiro, um sol matinal invade a entrada da Morais Soares desabafada de um lado com poucos prédios, o trânsito está a ficar para trás...
O autocarro agora desce em direcção ao seu términus-Santa Apolónia, volta-se a ver o rio e volta-se a ver outras realidades sociais, que baloiçam entre antigas cooperativas e prédios e pequenas quintas em ruínas, outrora aqui perto tudo era diferente no final do século passado, barracas, pequenas vilas operárias ou não e o eléctrico, eléctrico esse que há muito deixou de aqui perto passar. A Av. Mouzinho de Albuquerque é espaçosa e desafogada, o trânsito ficou para trás num dos extremos, lá em baixo o sol sobre o rio faz toda a diferença, os poucos prédios desta avenida dão outro ar numa Lisboa de betão e ferro.
Por fim volto a ver o rio sobre o viaduto que atravessa a linha do comboio, bela vista sobre a estação e bela vista portuária, de destacar as velhas casas onde ainda perdura um restaurante em que se preparam sardinhas assadas para o almoço à porta junto à entrada da Rua dos Caminhos de Ferro.
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